sexta-feira, 26 de julho de 2013

6ª Feira 24 Agosto Segundo dia em Invinha

Mais um amanhecer nas longínquas terras de África, ao som do chilrear dos pássaros e o aroma daquela terra barrenta, misturado com alegre cantarolar das crianças do internato. O pequeno-almoço já esperava por nós, não nos sentíamos de forma alguma satisfeitos, pois a nossa estadia estava de certa forma a ser de mera visita e laser e não o que nos propusemos desde de início, deixar a nossa marca com trabalho voluntário.
O trabalho para o dia já estava delineado, iríamos continuar com a distribuição de pão agora pelas ruas e pelas escolas em especial aproveitando a viagem até Gurué, pois iríamos visitar o Padre Luciano, que nos recebeu muito cordialmente e acompanhou-nos numa visita pelo espaço, aqui tivemos a oportunidade de ver alguns animais selvagens, nomeadamente crocodilos, aranhas gigantes e outros animais, ficamos também a perceber, que neste local além de estarem jovens internos também estão em regime de internato seminaristas e alguns escuteiros que pertencem ao Grupo de Gurué, além de que a quinta também serve, para alojar algumas entidades que de visita a Gurué possam desfrutar dum local de acolhimento com alguma segurança.
O padre Luciano, logo nos lançou o convite para um encontro entre os jovens do nosso grupo, os seminaristas assim como o Grupo de Escuteiros de Gurué e alguns jovens que quiséssemos trazer de Invinha, para quem sabe as sementes do escutismo, que mesmo não sendo a nossa prioridade seria sem dúvida um objetivo, mais uma vez o entusiasmo fazia-se notar na nossa face. Este encontro ficou marcado para o Domingo às 15 h com jantar e partilha de conhecimentos através do jogo. A manhã chegava ao fim e a fome também começava a apertar, tínhamos também marcado uma reunião de avaliação para a parte de tarde e um levantamento do ponto da situação, a nossa conversa com a irmã Madalena, tinha dado resultado e por fim iríamos deitar mãos á obra. Não foi de todo fácil fazermos as equipas, porque todos queriam estar em todo o lado, mas o nosso objetivo inicial iria ser cumprido com a divisão do grupo em função das suas aptidões profissionais. Também era necessário fazer um levantamento do trabalho a realizar, assim como o material necessário, desta forma ficaram constituídos os grupos.

Grupo de Eletricidade
Zé Fernando * Costa * Paulo * Luís

Informática e contabilidade
Tiago * Abílio * Armando

Saúde * Educação
Sara Cunha * Liliana * Patrícia Ribeiro * Marta * Patrícia Pereira *Cláudia Gomes * Sara Pereira

Construção Civil * Carpintaria e Canalização
Guilherme * Nelson * Diana * Cláudia Daniela * Tânia * Carlos

Responsável material e compras
Zé Maria

Agricultura
Todos dariam o seu contributo num dia em que juntamente com as pessoas da aldeia iríamos fazer os trabalhos de preparação para as sementeiras, na Machamba, assim se chamava o campo.
As Equipas iam mudando de local em função das necessidades, muito era o trabalho e apesar de sermos 21 elementos em algumas situações éramos poucos para o trabalho a fazer, tínhamos na verdade de valer em muitos locais.

Como responsável na aquisição de material e pelo levantamento de trabalhos a efetuar em alguns momentos atei as mãos na cabeça e partilhei com o Zé Fernando a minha preocupação, não sabia como havia de esticar o dinheiro para valer a tantas necessidades, mas o que mais me marcou foi a biblioteca e o material escolar, as crianças vêm para a escola apenas com um rudimentar caderno de apontamentos, livros não existem, apenas alguns e em mau estado na biblioteca que acabam por servir de consulta, para os cerca de 1000 alunos que frequentam a Escola Secundária Madre Maria Clara.
Depois de conversar com a Irmã responsável da Escola e diretora ficamos a saber que muitos destes alunos deslocam-se de bicicleta de aldeias distantes e a grande maioria a pé, demorando em muitos casos mais de 3 horas, pois transportes públicos não existem. Pior ainda a escola começa às 06,45 com a formatura e apresentação, com algumas notícias e o canto do Hino nacional, mesmo sabendo que esta escola tem cariz Católico ela é frequentada por alunos de outras religiões nomeadamente Muçulmana e até Hindus, não deixam de fazer as suas orações. Na verdade a evolução, como se costuma dizer, em Portugal retiraram os sinais de catolicismo das escolas, mas também retiraram o que nos marca como nação, se a moeda com a adesão á moeda única fez desaparecer o escudo, a bandeira Nacional já é sub valorizada em relação á bandeira da União Europeia e até o Hino deixou de ser um hábito nas nossas escolas daí não ser de admirar que a grande maioria dos nossos jovens não o saibam cantar.
Na biblioteca dei-me conta das muitas necessidades, nomeadamente:

Dicionários de Português – Inglês – Português
Dicionário de Português – Francês – Português
Livros de Filosofia 11º e 12º ano
Livros de Biologia 11º e 12º ano
Livros de matemática todos os anos
Além de como já referi antes quase todo o material escolar.

A noite começava a cair e a lista de trabalhos e respetivas necessidades a aumentar, como iriamos transportar cimento, ferro, areia, vidros etc. para fazer face às reparações necessárias na Escola, e na casa principal. Tínhamos pela nossa frente o árduo trabalho de fazer um passeio de mais de 50 metros, carregar com pedra e fazer as cofragens, tínhamos muitos interruptores, lâmpadas, tomadas para mudar, até o ar condicionado e os computadores da secretaria tinham de sofrer reparações, além dos muitos vidros partidos, fechaduras e torneiras para substituir, e não se pense que era por vandalismo dos alunos, era tão só falta de manutenção por pessoal qualificado e das intempéries do clima ao longo dos anos.
A ansiedade de começar os trabalhos era evidente, alguns já tinham andado a preparar durante a tarde os muros que iriam ser pintados, outros já preparavam o terreno onde iria nascer o passeio, já não havia fome, foi necessário mais que uma vez a irmã Ana Paula, vir chamar o pessoal, o Barnabé, bem esse levava-nos a tantos sítios para ver o que fazia falta e eram tantos que já dava impressão de termos lá passado mais que uma vez, a lista era imensa, começávamos a ter algumas dúvidas; será que encontraríamos o material que queríamos? Será que tínhamos dinheiro que chegasse?
Foi com todas estas dúvidas que depois de tantas insistências da irmã Ana Paula nossa guia espiritual e até da irmã Palmira, responsável do Hospital, que nos sentamos á mesa para jantar.
Nesta noite e porque as crianças não tinham escola no dia seguinte, quisemos ser nós a brindá-los com uma pequena festa e animação, fazendo com que através do jogo escutista os inseríssemos nas brincadeiras, as jovens deliravam, começava a haver uma forte empatia, queriam saber tudo sobre nós, quem éramos? Porque viemos? O que fazíamos na nossa vida pessoal? Sei lá tantas coisas e tantas perguntas que às vezes era preciso ter certo cuidado, para não melindrar aquelas jovens, algumas delas tão já magoadas pela dura vida.
Como habitual, pouco depois das 22,30 o dia chegava ao fim, com as orações e uma última canção cada um recolhia aos seus aposentos, alguns ainda aproveitavam enquanto os cães não estavam soltos para fumar um último cigarro ou até para telefonar aos familiares.

Apesar de alguns e pequenos conflitos, já se notava uma certa alegria, por enfim estávamos a trabalhar prol daquela gente.